29.9.08

 
Bora pra Borá


Se essa rua, se essa rua fosse minha, eu ia embora pra Borá.

Mas eu não sou da sua rua e, pior, não sou nem da minha rua, porque não me reconheço nesses caminhos estranhos de trânsito e faróis que apagam o tempo e nossas vidas entre uma marcha e outra.

Por isso, sigo em marcha pra Borá, pois cansei de ser pequeno na cidade grande, e quero ser alguém nesse município que de tão pequeno é o menor do estado e o mais indicado pro estado em que me desencontro.

E pra que ser grande se lá simplesmente posso ser? Ser amigos dos amigos dos meus vizinhos, conhecer cada um pelo nome, falar aquele “tarrrrde” que demora na língua, enquanto espero a noite que nunca tarda.

Em Borá serei uma pessoa sem pressas e sem essas, deixando o tempo passar entre os dias como quem valsa no meio de uma partida de futebol.

Serei presentemente o futuro do futuro, que lá a esperança não só me espera como também me carinha o rosto marcado pelos desgostos daqui.

Embora agora pra Borá!

22.9.08

 
Pôr-do-sol


Só se pôs por você.

16.9.08

 
Guarde você pra mim



Você se basta. Mas a mim não basta ter você.

Preciso muito mais do que tudo que egoisticamente me oferece.

Quero seu corpo, sua alma e seus sonhos, ainda que não esteja nem sonhando em estar dormindo.

Seus pensamentos, mesmo que esteja pensando em como alguém pode passar o tempo todo só pensando em você.

Seu cheiro, embora ele já impregne os travesseiros, meus pesadelos quando não está, a casa e o bairro quando se avizinha.

Suas idéias, que, de tão diferentes das minhas, são um reflexo de como deveria refletir de outra forma.

Sua voz, que me lembra como dói ouvi-la só na lembrança.

Por isso, não se gaste. Não se mova. Não me traia e nem fuja de mim. Permaneça imóvel aqui pra sempre. O mundo aí fora não merece você. E nenhuma outra pessoa precisa mais de você do que eu. Nem você mesmo.

9.9.08

 
Minicontos fraseados



Tudo o que passa diante dos meus olhos me cega.

E pra conceber um Brasil sem sede, tenho que conceder tudo.

Petrificar mais a pedra que esse coração virar.

Exigir que o seguro pague a perda total desse coração sinistrado que, de tanto ficar marcando passo, nem marca-passo resolve mais.

Fazer das tripas coração para que o coração seja cada vez mais tripa e menos coração.

E que preenche os copos que eu deixo vazios ao tentar preencher o vazio da ausência dela aqui.

Sentia que tinha uma espécie de ímã às avessas, que repelia as pessoas de si.

Pode controlar esse país sem pais e sem babás e mostrar que é baba politicar dando tapinhas nas costas e escorrendo veneno nas babas do fogo amigo.

Transformar os mais sangrentos boletins de ocorrência em canções de ninar.

Minha consciência não está à venda. E nem a venda está em mim.

6.9.08

 
MINICONTO
Dois anos



Órfão
Como cheguei até aqui
AplauS.O.S.
A incrível arte que eu não tenho de cantar junto uma canção que está tocando no rádio
Cada um tem seu par
A venda
Derrota
Debatendo a cara pra bater
Amuleto de mim
A neurolingüística da casa de papelão
Ex-tamira
Rio
Brasília
Feriados
O silêncio é a gente mesmo demais
Cemitério
Networking
Como é que chama isso aí sem nome?
Receita para um natal feliz
Ano novo, vida velha
Sérgio Sampaio
Sérgio Sampaio II
O prelúdio do dilúvio
Carência
Eu mereço coisa melhor
Três carnavais
I - Escola de Samba Unidos da Desunião
II – Bandeira branca
III – É carnaval em Salvador
O dia em que o Sol sair de novo
Soberba
Você acha que consegue me cansar?
Aeroporcos
─ Que qui cê tem de goró aí? Porque eu não preciso beber pra ficar alegre
“Desvio para o vermelho”
“A minha casa é uma caixa de papelão ao relento”
Roteiro turístico
Bem imóvel
Fudeu!
A etérea esterilidade do meu desejo eterno e efêmero
Carrinho de batida
Casamento II
Casamento I
Casamento 0
Rádio-relógio
Depressão geográfica
PARE DE SOFRER!
Presença de espírito
A queda
Japonês-Hilux
Aeroporcos II
Ônibus
Serpentinas em luto
Equação
A volta da Manu
A volta (ou A vida não é Algodoal)
Sua saudade não vale um cartão da Telemar
O copo
"Vim buscar tudo o que é meu"
O manto úmido da saudade
Recado
Cartão de crédito
“Cai no areal e na hora adversa”
“Doce de sal”
Amostra da mostra
Janela
Finados
Banheiros do Ó
Olhos de ver
Futuro
Cela de menor
Destaque do mês
Batida
A gente não tem natal
Nós somos os seus piores pesadelos
Vamos matar logo esta saudade
Marca
Azulejos
PF & Cia.
Comida
Oração
Normalmente
Horizonte
Horário de verão
O segredo
O segredo II
São São Paulos
Achei que você teve certeza de que tivesse me visto
Contramão
Dengue
1° Encontro Internacional de Desencontros
Casais
Horóscopo
MATA!
Teledoença
Onde se lê
TÁ ASSUSTADO?
Sem miniconto(s)
Não converso com estranhos
Vasos comunicantes
O ganhador
Nascimento
Zuz
Academia da Berlinda*
Sim para não
Operação Solta e Agarra
Batmãe
Essa onda diet que emagrece a vida
Malabares no ar
Olimpíadas do fracasso
Supersuperficial
Encontro

2.9.08

 
Encontro



Vou começar a fumar. Beber até perder a consciência. Não ter consciência. Me drogar. Dispensar os remédios controlados. Descontrolar-me. Sair por aí de madrugada sem hora pra voltar. Não voltar. Não ter casa. Não casar. Dançar. Dançar na vida. Transar com a primeira pessoa que aparecer. E com a última que reaparecer. Desaparecer. Esquecer de mim. Dos outros. Jogar fora o celular. Desligar a secretária. Não falar com ninguém até não ter ninguém para falar. Comer só o que não devo. Não ter dever. Dever pra todo mundo. Querer só meus direitos. Ser torto. Usar pouca roupa. Despir-me. Aprontar muito. Aprontar mais. Ouvir nada. Dizer todas. Virar-me do avesso. Ser avesso a tudo. Receptivo a nada. Pensar besteira. Deixar de pensar e de sentir.

E quando eu estiver totalmente perdido talvez volte a encontrar quem eu nunca fui.

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